31.1.11

Agiotas de afeto ( e por extensão.. de amor)

Cuidado! Os agiotas de afeto estão por toda parte! Espalhados nos lares, nos bares, nas salas de aula e repartições públicas! Infiltrados em nossas vidas, disfarçados de amigos e de amores; de amantes..colaboradores. Com seus discursos dissimulados e ombros dolosos nos estendem a mão pegajosa para jamais soltarem, para que quando, na vez deles precisarem e - por não se contentarem com reconhecimento e mais alguns trocados- cobrarem. E cobram. Cobram a prazo e com juros exorbitantes. Cobram o seu juramento - de igual presença, de igual envolvimento,de igual satisfação, de dever eterno. Assim, meus caros, o prazo nunca se esgota até que você se esgote. Até que a relação se esgote.

Cuidado com os agiotas de afeto! Cuidado também para você não se tornar um. Agiotas de afeto não são o que são por crueldade ou desvelo. A agiotagem de afeto beira uma epidemia! São pessoas carentes e inseguras que não sabem existir se não por essa torta maneira de ser. São pessoas que necessitam da constante e plural aprovação alheia e por isso se submetem à servidão condicional - sim, repito - condicional- dos outros - de seus ´outros´ com a ressalva de que esperam desses a mesma atitude ´em troca´, quando não mais!

Agiotas de afeto cometem o mais egoísta dos crimes. Possessivos, vivem suas relações como contratos (embora , juridicamente, algumas de fato o sejam), onde ambas as partes devem honrar suas obrigações. Pais com seus filhos, namorados, amigos entre si, colegas. Os níveis de expectativa e cobrança com relação aos contratantes (que aliás, nada pediram, tampouco assinaram) nunca estiveram tão altos! As vítimas não sabem mais como agir!

Se você sofre com as intermináveis cobranças de um agiota de afeto e se sente devedor por ingratidão, não se desespere, amigo - há solução! Começe despindo-se de qualquer culpa ou dívida imposta. Você não consumiu nada, portanto, não há conta a ser paga! Liberte-se daqueles que lhe jogam na cara que muito (quase nada) por você fizerem, pois quem necessidade tem de afirmar o que é, em muitos casos prega uma falsa fé - e te fazem crer que o são de fato um refúgio de afago amável quando se está vulnerável. Nunca confie em quem diz ser de confiança.Há coisas que não precisam ser ditas.
Já outras.. precisam ser constantemente relembradas, como estes versos de Drumond em as ´Sem-razões do amor´:


´Eu te amo porque te amo.
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.

Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.

Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.

Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor.´

5 comentários:

amanda daher disse...

preciso dizer que AMEI a sua visão nunca antes pensada por mim. essas pessoas estão no nosso dia-a-dia e nem percebem que são como são. tristes deles e coitados de nós, mas com um jeitinho tudo se resolve.
a propósito, os versos a mim já conhecidos de Drummond me fizeram relembrar uma coisa que eu, lamentavelmente, já havia esquecido: amor com amor não se paga.
obrigada por eu poder desfrutar mais uma vez de sua tamanha habilidade com as letras.

Prof. João Paulo Godoy disse...

Danada, você escreveu um montão de textos! Ficou um tempão no "Para Fernanda" e, agora, quando acesso o seu blog, tem esse tantão de textos!
(sou um agiota leitor de textos dos blogs amigos).

Gostei muito deste seu texto, porque convivo com essa agiotagem todos os dias. São pessoas frágeis, algumas um tanto quanto medonhas.

Mas eu devo confessar que eu próprio, muitas vezes, exijo dos outros o afeto que (não) me é devido.

Que nós saibamos sempre amar a nós próprios, em primeiro lugar. Ser usina viva de força e motivação dentro de nós mesmos. E buscar mais amar que ser amado!

Vou ler seus outros textos.

Não tenho o seu tel. e cel. Temos que tomar um café, conversar sobre as nossas vidas. Me passa por dep. no orkut!

alex disse...

Vi um pouco da minha relação com o meu pai aí nesse texto, relação com o pai são sempre conturbadas..
Boa escolha do poema de Drummond :D
Gostei.

Jean-Louis disse...

Perdi o sono e acordei há pouco, resolvi navegar um pouco na net para ver se conseguia adormecer e meio que por acaso topei com seu interessante texto. Nunca fui vítima desse tipo de "agiotagem" afetiva, até porque em casa não recebi afeto algum e, felizmente, os poucos amigos que tive e hoje tenho nunca me fizeram esse tipo de cobrança. Dá-se afeto visando o crescimento daquele que o recebe, e como nada nele nos pertence, nada pode ser cobrado mais adiante. Gostei do título.

pequena disse...

Disponha! Engraçado você mencionar o título.. tenho uma preocupação absuuurda com a sonoridade dos meus títulos. ;)

Fiquei intrigada agora.. não existe "meio" acaso. Como foi mesmo que você chegou até aqui?