9.2.10

Por sorte nunca estaremos prontos.

Não estava pronta para nascer e, no entanto, prematuramente nasceu. Nem seus pais estavam prontos para serem pais e, errônea e amorosamente, o foram.
Não estava pronta para o amor.

Não estava pronta para andar, tanto é que caiu e levantou inúmeras vezes antes de se equlibrar nas duas pernas.Não estava pronta para falar.No começo balbuciou coisas imcompreensíveis que a mãe, a avó a as tias achram lindo.Depois falou.Alguém não estava pronta para seu primeiro dia de aula (nem para todos os seguintes).Esse alguém era sua mãe que vivia alí o segundo de tantos outros partos e não podia se conformar com o despachamento de sua cria.Ou era ela,insegura, que no instante era ela mais a barra da calça da mãe - fundidas em uma só.
Não estava pronta para as primeiras amizades, nem para as mordidas,beliscões e choros que "viennent avec".Não estava pronta para somar, subtrair,dividir nem multiplicar, nem para um universo tão grande como o das palavras. Mas se saiu (bem).
Não estava pronta para as primeiras mudanças que chegaram sem nem mesmo lhe dar aviso,curvando-lhe o corpo que por consequência começaria a curvar cabeças do sexo oposto.Era o primeiro e talvez o único infantícídio que assitira - o seu própio - e não estava pronta para abrir mão da liberade,das bonecas, do riso solto, das horas vagas.Mas se conformou e ainda que não pronta, com coragem ,altas expectativas e pressa.. encarou o luto da infância e mergulhou na pré-adolescência.
Não estava pronta para o primeiro beijo - tanto não estava que foi aquela coisa estranha,nervosa,sem saber muito o que fazer com as mãos, a língua e etc.Dentes,saliva,aparelho, condensados por um certo desconforto e ansiedade para com a performance (mais do que com o prazer próprio) que resultaram em um dos episódios mais marcantes - a ser guardado com carinho e constrangimento.Certas coisas aprenderia com a prática.

Não estava pronta para as escolhas, nem para os rótulos. Não estava pronta para se levar á sério. Não estava pronta para relacionamentos sérios.Não estava pronta para a dor.Não estva pronta para sua primeira vez. Não estava pronta para o gozo nem o prazer.Todavia levou-se,rotulou e escolheu...deu (no que deu).

Ainda não pronta para a paixão,se apaixonou.

Não pronta para a juventude adulta,terminou de adolescer.Não estava pronta para a faculdade, mas entrou. Não estava pronta par gostar ,e, não é que gostou?Não estava pronta para maior liberdade.Presa, se libertou.Não estava pronta para o trabalho, nem para errar com submissão, mas errou.Não estava pronta para a glória, o sucesso nem o reconhecimento.Não estava pronta para acreditar(nem em si). - Acho que mesmo no fim,verdadeiramente ele nunca acreditou.

Não estava pronta para o compromisso.Comprometeu-se.Não estava pronta para dividir o teto,os sonhos,os planos,as perdas,as contas e a cama.Porém dividiu.

Não estava pronta para o mundo.Nem o mundo estava pronto para ela, mas se encontraram.

Como seus pais, não estava pronta para ser mãe.No entanto o foi "errônea e amorosamente". Não estava pronta para o parto, nem para os que seguintes que viriam, mas deixou partir. Não estava pronta para abnegar ,mas abenegou. Não estava pronta para abdicar.Abdicou.Não estava pronta para o medo e se assustou.Não estava pronta para brigas.Brigou.
Assim seguiu sua vida.. nunca pronta para ser vivida - ainda que isso não a impedisse de vivê-la, pois sabia que vivendo se está sujeito à erros e acertos.Movida à medo,coragem,curiosidade e entrega..ela viveu.

No seu leito de morte, mas do que nunca não se sentira pronta.Pronta para morrer(?), pois ainda não realizara tantos outros desejos e objetivos que em vida não havia se julgado pronta(o suficiente).A espera matara-a.À espera do estar pronto(estamos).

7 comentários:

João Paulo disse...

Que lindo. Acho que esse seria um texto toddyano excelente, porque é exatamente essa a essência humana.

Que belo texto, Paula. Às vezes, a gente nem quer comentar, porque o texto diz tudo.

Acho que você estava falando sobre o medo, não é? É um dos assuntos que você disse que tinha vontade de escrever. Acho que falou exatamente sobre o medo, ou melhor: sobre o enfrentar o medo, porque o personagem no texto (você, será?), apesar de ter medo, teve coragem para enfrentar tudo.

Ao texto, acrescentaria aquela frase legal pra caramba: "E sem saber que era impossível ele foi e fez!".

Acho que seu texto nos transmite uma grande paz por isso: não precisamos de estar prontos. O seu texto mostra essa fragilidade humana, que é tão verdadeira e existe em todos nós. Queremos estar prontos, porque buscamos uma certa previsibilidade...

Mas a vida humana é imprevisível, insegura. E talvez estejamos prontos, sim, apesar de não achar (essa reflexão nos induz a crença em Deus, não é? As coisas vem a nós, porque por mais que não achemos estar na hora, Deus acha).

Paula, minha amiga, simplesmente 10 esse texto. Estou sendo sincero, viu? :)

Daniel Simon disse...

Como disse o bloguero ai de cima, o texto diz tudo, não há oq comentar.

Estaremos prontos algum dia? Tudo que sei é que nos arrependemos de fazer ou deixar de fazer.

Rabelo disse...

Paula, sempre me furtei em comentar no seu blog, embora fique aqui esperando ansiosamente para me deleitar em suas brilhantes idéias. Mas hoje não resisti. Tomei a liberdade de fazer esse comentário, por que tenho que lhe parabenizar por essa publicação, que penso ser uma 'realidade'. Nem sempre estamos prontos para as peripécias que a vida nos reserva. Bom, Parabéns e espero poder ler mais de suas magníficas redações.

pequena disse...

Caramba, Rabelo!Nossa, que surpresa! Há quanto tempo -acho que a últims vez que nos vimos foi ao acaso..no supermercado,lembra?!Puxa,fico muito feliz e satisfeita mesmo que você venha,ainda que sortunamente.Fico ainda mais feliz que as minhas singelas produções te acrescentem algo.Até porque mantenho o blog como puro hobby (e como uma teerapia também,confesso).. às vezes fico meses sem escrever.Emfim..
Apareça mais,sempre que quiser! Bjo.

Anônimo disse...

Ah, obrigada. E eu já tinha lido seu texto e gostei tanto que achei que não tinha palavras pra descrever a minha experiência, então nada escrevi.
Só agora que vi o seu comentário no meu blog que por sinal, me fez muitíssimo bem e vim aqui agradecer.

Mais uma vez, obrigada.
Talita

Rabelo disse...

Claro que me lembro, foi no Extra, quase 13:00hs =). Bem, parece que essa sua 'terapia' tem ajudado outros tambem, por isso nao pare nunca!!! Não seja tao modesta suas produçoes sao magnificas.(as vezes fico lembrando da epoca do piaget e externanto e pensando, por que voce nao nos dava o prazer dessas leituras? =). Agora com a sua permissao continuarei a ser um leitor assiduo heheh. Obrigado.
ps: voce ainda esta em gyn? fazendo o que da vida? mande noticias!! bjao

Luíza Leão disse...

seu texto me lembrou meu salto de baguee jump.cheguei lá em cima,olhei pra baixo e não nao estava pronta.mas tive um empurrãozinho..concordo com o João, talvez esse empurrãozinho mais que necessario em nossas vidas seja feito por Deus, "pelo cara Lá de cima..".mas as vezes acho que nos olhamos algo e sim, estamos prontos...não?
muito bom texto!!!